FÓRUM DE TRABALHADORES DA SAÚDE MENTAL DE NITERÓI

AUDIÊNCIA PÚBLICA – 13/12/2011
Cidadãos de Niterói: usuários, familiares e trabalhadores da Saúde Mental, senhores vereadores e demais convidados, boa tarde. Comparecemos hoje nesta casa que é a nossa, para dar-lhes um breve, mas preciso panorama sobre como se encontra a Rede de Saúde Mental de nosso município, no que se refere aos direitos humanos.

No dia 29 de junho de 2011, um ato público em frente a esta Câmara manifestou a insatisfação de trabalhadores e usuários da Saúde Mental com relação à forma como a Prefeitura tem conduzido politicamente as ações neste campo. Insatisfação que arriscamos dizer que não é só nossa, mas que abrange a Saúde Pública como um todo.

A partir deste ato, nós, trabalhadores da Saúde Mental desta cidade, fundamos um Fórum que representasse a mobilização surgida naquele dia histórico para a luta por melhores condições de realizar nossa tarefa, que é a de oferecer aos nossos concidadãos serviços adequados as suas necessidades. O nosso pronunciamento de hoje é fruto das discussões ocorridas nos encontros deste movimento.

Nós propomos, nesta ocasião, a abertura de um debate que não pode se restringir a este breve momento e que entendemos dever se dar preferencialmente neste local, na Câmara Legislativa. Cabe a nós cobrar dos membros desta casa, de uma maneira mais próxima, que se posicionem frente à precariedade com a qual nos deparamos cotidianamente. Para tanto, precisamos começar pela apresentação dos sérios impasses que vêm se agravando ao longo dos anos no nosso campo. Impasses que têm trazido risco de iminente desassistência aos pacientes que acompanhamos.

O que nomeamos como Rede resulta de árduo trabalho há, pelo menos, vinte anos. Trabalho de diversas categorias profissionais, as quais sempre se comprometeram e se comprometem eticamente com o cuidado, com a atenção àqueles acometidos por sofrimento psíquico. É o empenho destes profissionais que dá substância e eficiência a seis ambulatórios, quatro CAPS (Centros de Atenção Psicossocial), à ERIJAD (Equipe de Referência Infanto-Juvenil para Ações de Atenção aos Usuários de Álcool e outras Drogas), um Centro de Convivência chamado de “Oficinas Integradas”, duas residências terapêuticas, quatro apartamentos no PAC Preventório para moradia assistida, uma emergência psiquiátrica 24h e o Hospital Psiquiátrico de Jurujuba, com quatro enfermarias para pacientes agudos e duas para aqueles de longa permanência.

Vale destacar o trabalho pioneiro de Acompanhamento Domiciliar e ressaltar a Escola de Redutores de Danos e o Consultório de Rua, vinculados ao CAPS AD. Para a remoção psiquiátrica, contamos com o SAMU. Cerca de oito mil niteroienses são usuários destes serviços, cujas existências estão absolutamente respaldadas nas leis que regulam a Saúde Mental e que, seguramente, são de conhecimento de nossos legisladores e executivos.

O que não tem respaldo legal é a perpetuação de 130 leitos para internação em clínicas privadas contratadas, a saber: Casa de Saúde Alfredo Neves e Instituição Frederico Leomil. Aproveitamos a oportunidade de falar num espaço aberto pelo Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Vereadores para destacar as condições sub-humanas as quais os pacientes internados nestes manicômios são submetidos. O município de Niterói não pode mais conviver com este modelo anacrônico e incoerente com as premissas da Reforma Psiquiátrica Brasileira. Necessitamos de corajoso apoio político para intervir imediatamente nestes asilos e para podermos acolher estes cidadãos que lá se encontram. 

Discutir direitos humanos é falar de dignidade humana. Sem dúvida, o trabalho é um componente fundamental de uma vida digna. Os profissionais da Saúde Mental desta cidade dão valor ao seu trabalho, mas não conseguem realizá-lo plenamente. Não é possível viver dignamente pela metade. Não podemos nos sentir realmente dignos se não temos direitos trabalhistas básicos garantidos. Não podemos nos sentir realmente dignos se somos mal remunerados e se nossos salários são pagos com inconcebível atraso. Não podemos nos sentir realmente dignos se a Prefeitura organiza uma seleção pública que não garante nem a manutenção do que já existe em nossa Rede, muito menos o avanço necessário para a resolução de nossos problemas atuais.

Um indivíduo digno anda de cabeça erguida e trata os outros de maneira justa e respeitosa. Nós fazemos o possível com este intuito, mas não dispomos, em muitas ocasiões, dos meios materiais para termos êxito pleno. Não dá para fazer valer os direitos humanos quando nossos pacientes não têm um remédio de que precisam para se manter saudáveis. Não dá para fazer valer os direitos humanos quando um CAPS não consegue dar três refeições decentes a sua clientela. 

É também nas pequenas coisas que exercemos nossa dignidade. É impossível aceitar que nossos pacientes derretam com o calor de nossos consultórios, assim como é impossível compactuar com o péssimo estado de conservação de nossos serviços, com o mofo que causa alergias e com as portas quebradas que precisam ser seguradas com cadeiras para permanecerem fechadas. O município precisa zelar pelo que é seu, pois isso corresponde a zelar pela sua população.

Por muito tempo, os trabalhadores da Saúde Mental de Niterói conviveram com situações que não podem ser toleradas. Hoje entendemos que não dá para simplesmente esperar pelas soluções para nossos problemas. Precisamos ter uma postura mais ativa e combativa e é a isto que o Fórum se propõe. Nós não descansaremos e não pararemos por aqui. Este texto é um “pontapé inicial” numa luta que se travará aqui e na Prefeitura pelos direitos humanos dos profissionais e usuários da Rede de Saúde Mental de nossa cidade.

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